Memórias de Prédios
Memórias de Prédios

Os Engenheiros

O pavor de entregar flores na casa dos Chaves não atrapalhou a amizade que Leopoldo Schmidt tinha com o filho de Martha Chaves: João Vitorino. Eles foram colegas na faculdade de engenharia até quando Leopoldo decidiu escolher a ênfase em Mecânica. Hilda, que conhecia todo mundo, conseguiu uma vaga para o filho na empresa de máquinas industriais Linck S.A. O fundador Geraldo Tollens Linck estudou com Hilda no Colégio Bom Conselho. Já Chaves escolheu a engenharia Civil e fez carreira no ramo imobiliário.

Algumas fontes comentam que Chaves, portanto, teria tido alguma participação na construção do São Lucas, visto que o seu nome é comumente ligado a de um outro engenheiro: Ricardo Fermi Martins. Um exemplo disto é o Jardim Independência, o edifício vizinho a oeste do São Lucas, construído pelos dois engenheiros em meados da década de 70. Leopoldo comenta que João Vitorino viveu os seus últimos anos na cobertura do Jardim.

Este prédio possui um recuo lateral de 16 metros por conta de uma área verde incomum para as construções da região, fazendo jus ao nome. O Jardim possui duas frentes, uma para a Independência e outra para a André Puente. Em uma peça publicitária no Diário de Notícias de 3 de janeiro de 1965, ele era anunciado com a seguinte frase: “O ponto chave entre o confôrto da cidade e a aristocracia da Av. Independência, Praça Júlio de Castilhos e Rua André Puente”, e ainda como “condomínio de elevado gabarito social, a preço de custo”. Em outro anúncio no meio dos classificados imobiliários, o apartamento de 300 metros quadrados é chamado de “mansão suspensa”.

 

No número 1138 da avenida Independência, Chaves e Martins levantaram o vizinho do São Lucas. Diário de Notícias, 25 de abril de 1965.

anuncio diario de noticias - jardim independência

“É bom porque se cair uma bomba na cidade os teus prédios ficam inteiros”- dizia Voltaire

Por volta de 1965, a Família Almeida Castro se mudou para o São Lucas. João lembra de seu pai, Voltaire, dizer que Ricardo Martins era um “engenheiro de ponte”, dada a solidez de suas construções, com coluna vigorosas. “É bom porque se cair uma bomba na cidade teus prédios ficam inteiros”, dizia Voltaire e Ricardo respondia “E ficam inteiros mesmo!”

“E ficam inteiros mesmo” – confirmava Ricardo

Ouça abaixo João Gasar de Almeida Martins falando sobre como seu pai chamava Ricardo Fermi Martins:

O nome de Ricardo Fermi Martins consta nas plantas dos apartamentos do edifício como responsável pelo projeto e construção. O São Lucas é o empreendimento mais antigo da empresa do engenheiro, com carta de habitação expedida em 2 de junho de 1966. Ricardo seria reconhecido mais tarde como um prolífico construtor de dezenas de edifícios, com mais de 150 metros quadrados de área construída na capital gaúcha.

A construção, no entanto, é mais antiga, pois o edifício já começa a constar nas páginas de classificados, como em um anúncio do Diário de Notícias de 18 de outubro de 1964: “Transfere-se os direitos de contrato, apartamento de frente para a Independência c/3 dormitórios e em fase final de acabamento”. Em um novo classificado, 42 dias depois, no mesmo jornal adiciona ao texto a informação: “entrega em abril de 1965”. O endereço informado no anúncio (“Av. Borges, 967”) nos dá um pista para chegarmos a um dos primeiros proprietários do São Lucas: Teodoro Ritter.

Classificados no Diário de Notícias de 1964 dão conta de que São Lucas seria entregue em abril de 1965.

Teodoro Ferreira Ritter foi um construtor que levantou edifícios no centro de Porto Alegre, entre eles o Caiçara, um prédio localizado na esquina da rua Cel. Fernando Machado com avenida Borges de Medeiros. Martins foi contratado como engenheiro e acabou se casando com a primeira filha de Ritter. O casamento deles, no entanto, teve um fim precoce. Lara sofria de diabetes, o que acabou lhe tirando a vida em 18 de setembro de 1960.

Anúncio de convocação para missa de 7º Dia do falecimento da filha de Teodoro, Lara Ritter. (Imagem alterada digitalmente)

Martins continuou tendo boas relações com a família do ex-sogro. “Ele foi o filho homem que Teodoro não teve”, conta o segundo genro de Ritter, o médico Júlio César Vieira Ramos que se casou com Miriam, a segunda filha de Ritter.

Teodoro vivia numa grande chácara na Tristeza, na rua Dr. Mario Totta. Ele criava aves de diversas espécies como canários de competição, pavões e faisões raros. Tinha também muitos cachorros e pôneis na propriedade, de acordo com as lembranças de sua neta Roberta Ritter.

 

Reprodução do Certificado de Registro do Roller Clube Gaúcho datado de 1956 (modificado com pseudônimos). 

 

Segundo Ramos, quando seu sogro esteve próximo de se aposentar, perto dos 60 anos, acabou vendendo alguns imóveis e investiu num apartamento que lhe desse alguma renda. Foi quando comprou o apartamento A-18 do edifício São Lucas, um dos primeiros prédios da empresa do ex-genro Ricardo Martins.

Apesar de seu nome constar nas assinaturas da primeira convenção de condomínio do São Lucas, Teodoro Ritter, no entanto, nunca morou no A-18. O primeiro morador deste apartamento foi justamente o segundo genro, Ramos, que voltava de uma temporada de estudos nos Estados Unidos.

Ouça abaixo o relato de Júlio César Vieira Ramos sobre a vinda para o São Lucas

Ramos gosta de dizer que é apenas “um moleque da Pedra Redonda”. No exterior, morou e alguns apartamentos, mas, ao voltar para o Brasil, seu desejo era ter uma casa na zona sul, próximo das suas origens. Mas Miriam não queria mais ficar na zona sul e Ramos acabou concordando, meio contra a sua vontade, acatando a proposta de alugar o apartamento do sogro na Independência.

 

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